Quem não nasceu em Brasília como eu, mas mora aqui, acho
que vai me entender. Quando a gente visita a família, no meu caso no interior
de Minas, sempre ouve piadinhas do tipo: já encontrou o Bolsonaro lá? Ao que eu
respondo sem render assunto: Deus me livre! Ou então, qual o deputado que você
já viu lá em Brasília? Como se os senhores deputados andassem pelas ruas fora
das eleições. Tem também a mais clássica de todas: é verdade que em Brasília
não tem esquinas? Como se aqui a gente só andasse em linha reta, infinitamente.
E claro todos os parentes acham que você é rico, que aqui todo mundo ganha uma
fortuna e mora em mansões na beira do lago. É normal. Faz parte. Já estou
acostumado.
Mas o que seria mesmo a cara de Brasília? Estou com essa
pergunta me cutucando esses dias. Para mim que, como tantos outros, chegou aqui
querendo passar uma chuva, mas acabou não voltando mais, pelo simples motivo de
ter se apaixonado pela Capital, muitos detalhes legais podem responder a essa
pergunta. Vou tentar me lembrar de alguns: correr no Parque da Cidade num
sábado de manhã, caminhar no Eixão aos domingos, tomar uma cerveja no Beirute,
comer um pedaço de pizza em pé na Pizzaria Dom Bosco, ficar encantado com o pôr
do sol à beira do lago, comer pastel com caldo de cana na Pastelaria Viçosa da rodoviária,
olhar para o maravilhoso céu de Brasília e dizer agradecido: não temos mar, mas
temos esse céu que ninguém tem ou ainda andar por quadras (e não ruas!) que não
têm nomes, mas coordenadas. São todos detalhes gostosos da Capital.
Tudo isso é muito Brasília. Agora tem outra coisa que para
mim, principalmente nesse final de ano, identifica demais essa cidade, tão
grande e, ao mesmo tempo, tão interiorana, que é pegar manga no pé. Como é
gostoso andar pelas quadras de Brasília, embaixo dos pés de mangas, sentindo o
cheiro gostoso da fruta e ver a calçada colorida de amarelo e rosa. Depois de
dez anos, descobri e, a partir de agora, para mim, sempre que me lembrar de
Brasília, vai vir na cabeça essa sensação tão gostosa de pegar manga no pé, que
é a cara de Brasília.