Sou apaixonado pelos livros. Não consigo sair de casa sem
ter um livro nas mãos. Mas nem sempre foi assim. Não vou dizer aqui, como
muitos escritores, que na minha infância a casa era repleta de livros. Seria
uma mentira. Sou de família pobre e, na minha infância, quase não tive a feliz companhia
de livros, a não ser nas bibliotecas. Mas certa vez, meus pais compraram para
mim uma assinatura da revista Nosso Amiguinho e, junto com as revistas, veio
também o livro Heróis de verdade, que trazia a biografia ilustrada de grandes
personalidades mundiais. Como sempre gostei de ler e não tinha muitas opções,
li e reli esse livro várias vezes.
Entre as personalidades biografadas, havia o marechal
Deodoro da Fonseca. Não sei o porquê, mas esse personagem de longa barba
branca, olhos penetrantes, nariz adunco e cara de bravo me cativou. Fiquei tão
interessado por sua história de vida, que passei a desenhar sua fisionomia
marcante em cadernos de escola e criar histórias imaginárias com o valente
líder militar. Isso faz mais de 30 anos e nunca contei antes essa história para
ninguém.
Com o passar dos anos, após muita leitura, conhecimento e
uma graduação em História, outro personagem ganhou relevância na minha
admiração: Dom Pedro II. Quanto mais leio sobre ele, mais aumenta a admiração
e, para mim, o nosso velho imperador é o maior brasileiro de todos os tempos.
Com isso, Deodoro se transformou no antagonista, no vilão, no responsável por
todos os males causados por essa ré-pública de bananas, proclamada por ele.
Há quase três anos, resolvi escrever o romance A mulher
que proclamou a República, que estou lançando agora pela Editora Penalux. Nesse
romance, o marechal Deodoro é o personagem principal. É ele que eu coloco num
divã para contar suas vitórias, alegrias, derrotas, tristezas, conquistas,
casos de amor e decepções. Quando comecei a escrever, claro, Deodoro era o
Judas que eu queria malhar. Porém, após retomar a leitura de livros sobre sua
vida e durante a construção do romance, esse ódio inicial foi sendo aplacado, e
o personagem foi ganhando vida própria nas páginas do meu romance. Ao fim desse
livro, o personagem que levo para as pessoas é um Deodoro bastante humano. Nem
o líder carismático e heroico da minha infância, nem o demônio encarnado das
minhas leituras posteriores, mas o ser humano complexo e contraditório, repleto
de acertos e erros, certezas e contradições, Manuel Deodoro da Fonseca.
Estou feliz com a aceitação do livro, que já chegou em todas as regiões do país, e realizado também por ter acertado, tantos anos
depois, as minhas contas pessoais com o senhor Deodoro da Fonseca.