sábado, 10 de setembro de 2011

Mãe de filho único

Dizem que o amor de mãe é infinito. Nada pode ser comparado a este amor. O que será, então, o amor de mãe de filho único? Infinito à enésima potência? Acho que nem a Física consegue explicar. É um verdadeiro mistério fora do alcance da ciência humana, como os gols de Pelé, como os versos de Drummond.

Tenho as minhas opiniões científicas sobre o assunto. Acho que o coração da mulher, após ter o primeiro filho, prepara-se de tempos em tempos, para a chegada dos próximos. É a natureza de mãe. Quando isso não acontece, esta energia amorosa vai se acumulando, vai crescendo, vai tomando força e vai ficando insuportável para o seu filho único. É a energia de uma bomba atômica acumulada em uma mulher em direção ao seu filho, indefeso diante de tanto amor.

Dizem que todo filho único é mimado. Grande injustiça com os pobres coitados. Filho único não é mimado. Ele apenas cede à força das circunstâncias. Ele luta muito. Mas não há como lutar contra a força atômica do amor de mãe de filho único. É uma luta em vão.

Quando se levanta para ir à escola, seu café com leite já está servido. Nem quente e nem frio. No ponto, como ele gosta. Não só o café, como o pão com o presunto, queijo e maionese, já estão a sua disposição, arrumadinhos sobre a mesa. Não adianta querer levantar da mesa, pois sua mãe lhe traz as bananas, a maçã e o guardanapo. Não adianta dizer que não quer, pois ela se antecipa. Quando ele pensa em dizer, quando ele olha em direção a, sua mãe já lhe trouxe o guardanapo.

Não é fácil ser filho único.

Chateado com sua primeira derrota no dia, o filho único volta para o quarto na intenção de arrumar a sua cama, mas é surpreendido, novamente, com a velocidade de sua mãe: o quarto já está arrumado e a sua roupa, sobre a cama, passadinha. Não tem mesmo jeito e ele vai para a escola, com um sentimento de falta de forças, revoltado na sua condição de filho único.

No retorno da aula, tem o firme desejo de limpar os seus tênis. Chega, tira as suas coisas, almoça. A rotina é a mesma. Não faz nenhum esforço, pois ela providencia tudo. Resolvido, pensa numa reação: “hoje, vou surpreendê-la. Não vou assistir aos programas de esporte. Logo depois do almoço, vou direto lavar os meus tênis”.

Acaba de almoçar e corre para o quarto. Nem escova os dentes. Procura daqui, procura dali, mas não encontra nada. Até imagina o que aconteceu, mas ainda tenta:

__ Mãe, cadê os meus tênis. Hoje, quero lavá-los.

__ Meu filho, eu já estou lavando eles. Pode assistir ao Globo Esporte. Deixa que eu mesma lavo. Nem estão tão sujos...

Tá vendo? O filho único é esforçado. Quer ser como todo mundo. Quer cuidar de suas próprias coisas, de sua própria vida. Mas é uma luta em vão.

Quando fica mais velho e começa a sair para arrumar namoradas, sua mãe sente-se ameaçada. Pela primeira vez na vida, não consegue controlar tudo. Mas ela não desiste nunca:

__ Meu filho, tá levando dinheiro?

__ Vê se não volta tarde, hein.

__ Tá levando blusa?

__ Muito cuidado com quem você anda, viu meu filho.

Não é fácil. Ainda dizem que ser filho único é a melhor coisa do mundo. Fala assim, quem não conhece a sua realidade.

Ao retornar para a casa, entra bem devagar, pé ante pé, para não acordar ninguém. Sente-se aliviado, quando sua mãe não está deitada no sofá, esperando por ele.

No dia seguinte, o sentimento de derrota aparece novamente:

__ Meu filho, por que você chegou ontem tão tarde?

__ Não cheguei tarde, mamãe.

__ Chegou sim, meu filho. Você chegou às três horas e oito minutos, que eu vi. Não adianta querer me enganar, tá! Não dormi até você chegar.

Quando leva uma namorada em casa, é o grande momento do confronto. Sua mãe não perdoa. Joga no ataque permanente e usa de todos os seus artefatos amorosos. Enquanto seu filho único assiste a um filme com a namorada na sala, ela está na cozinha, sempre alerta, tramando e preparando a munição.

__ Meu filho, quer que eu descasque umas laranjas pra você?

__ Não precisa, mamãe...

Cinco minutos depois, ela ataca novamente:

__ Meu filho, fiz aquele pudim que você gosta tanto! Olha só que beleza!

__ Não precisava, mamãe...

Não satisfeita, ela volta em definitivo, dez minutos depois e senta-se ao lado do filho, passando as mãos nos seus cabelos. Sem olhar para a desafeta, joga a bomba definitiva:

__ Nossa, como o meu neném está bonito! Você é o neném mais bonito do mundo!

Sorri, suspira, faz biquinho e belisca as duas bochechas de sua cria.

O filho único sente-se totalmente aniquilado e tem vontade de escorregar para debaixo do sofá.

Quando ela sai, vai correndo ao banheiro, morder a toalha de raiva e enxugar as lágrimas da vergonha.

Sua namorada, sozinha na sala, assustada e ferida, vendo a oportunidade, sai correndo e não volta nunca mais.

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